Modulação dos efeitos da decisão do STF: hipóteses de cabimento
A jurisprudência do STF tem se desenvolvido cada vez mais no sentido de aplicar às suas decisões a chamada "modulação dos efeitos" da pronúncia de inconstitucionalidade, instituto previsto no artigo 27 da Lei nº 9.868/99.
Embora previsto em Lei Ordinária, o Supremo Tribunal Federal já aplica tal modulação desde 1974 (RE 78.594), quando atestou, em Recurso Extraordinário, que a inconstitucionalidade de lei estadual não torna nulos os atos praticados por Oficial de Justiça nomeado com fundamento na mesma lei.
Com a edição da Lei 9.868/99 foi expressamente consagrada a hipótese de modulação, muito embora tenha sido acrescido um requisito específico para sua aplicação, a saber, o quorum de 2/3 dos votos dos Ministros do Supremo. Eis o dispositivo citado:
Art. 27. Ao declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, e tendo em vista razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social, poderá o Supremo Tribunal Federal, por maioria de dois terços de seus membros, restringir os efeitos daquela declaração ou decidir que ela só tenha eficácia a partir de seu trânsito em julgado ou de outro momento que venha a ser fixado.
Daí surgem algumas dúvidas: a) a modulação é aplicável no controle concreto/difuso de constitucionalidade? b) somente a declaração de inconstitucionalidade pode motivar a modulação dos efeitos da decisão do STF, ou seria possível aplicar tal instituto em qualquer caso no qual se verifique a necessidade de preservar a segurança jurídica ou o excepcional interesse social?
O próprio STF vem respondendo a tais indagações, ainda que de maneira vacilante ou incerta.
Quanto à primeira, o STF se posiciona no sentido de que o artigo 27 da Lei 9.868/99 seria aplicável à declaração incidental de inconstitucionalidade (vide, como exemplo, o RE 273074 AgR) .
Quanto à segunda, embora não declare expressamente de forma inequívoca, há precedentes importantes do STF que modulam os efeitos das decisões da Corte em razão de mudança de jurisprudência, tenha ou não ocorrido a pronúncia de inconstitucionalidade, sob o fundamento de que mesmo a mudança jurisprudencial pode causar transtornos quanto à segurança jurídica (vide, como exemplo, o MS 26.602, questão da fidelidade partidária).
A possibilidade de modulação em casos de mudança de jurisprudência deverá ser apreciada em breve pelo STF, no RE 377.457 , no qual se discute a validade da suposta revogação da isenção de COFINS das sociedades profissionais, instituída pela LC 70/91. No julgamento ocorrido em 2008, cinco ministros votaram pela modulação (haja vista a decisão do STF contrariar diretamente a Súmula 276 do STJ), sendo que a Ministra Ellen Gracie estava ausente.
O resultado proclamado pelo STF foi a rejeição da modulação, sob o argumento de impossibilidade de atingir o quorum de 2/3, previsto no artigo 27 da Lei 9.868/99.
Por conta disso, o Conselho Federal da OAB, que atua como assistente no feito (verdadeiro amicus curiae), apresentou Embargos de Declaração no qual cita ensinamentos do Professor Luís Roberto Barroso, em parecer anexado àquela peça, no sentido de que referido quorum seria inaplicável. Vejamos alguns trechos do citador parecer (veja íntegra dos Embargos de Declaração aqui):
"Na linha da jurisprudência do STF, a modulação temporal dos efeitos de decisão judicial pode ocorrer em quatro hipóteses: a) declaração de inconstitucionalidade em ação direta; b) declaração incidental de inconstitucionalidade; c) declaração de constitucionalidade em abstrato; e d) mudança de jurisprudência. Precedentes emblemáticos e recentes do emprego da modulação temporal em tais casos, como se sabe, foram a mudança do entendimento da Corte relativamente (i) à competência para ações acidentárias, que passou da Justiça Estadual à Justiça do Trabalho; e (ii) ao regime de fidelidade partidária.Pois bem. Em se tratando de modulação por mudança de jurisprudência, data máxima venia, não há que se falar na aplicação do art. 27 da Lei 9.868/99 e, por conseqüência, no quorum de dois terços nele previsto. Com efeito, o dispositivo invocado versa sobre a declaração de inconstitucionalidade de lei ou ato normativoproferida em abstrato pelo STF. No presente caso, porém, - e o ponto dispensa maiores considerações - em momento algum se pronunciou a inconstitucionalidade de lei. Ao revés, o entendimento dessa Eg. Corte quanto ao mérito, em última análise, foi no sentido da validade da alteração produzida pela Lei n° 9.430/96."
Esta última possibilidade de modulação (nos casos de mudança de jurisprudência) é quase que um imperativo atualmente, em razão da crescente vinculação quer vem sendo instituída, paulatinamente, no sistema processual (plenamente consolidada com os institutos da "Repercussão Geral" e do "Recurso Repetitivo").
Recentemente, fizemos um apanhado com uma série de decisões do STF em que houve a modulação dos efeitos da decisão final. Referida compilação pode ser encontrada no nosso blog Infojur e estão marcada com a tag "modulação dos efeitos".
Tais decisões também podem ser conferidas no nosso slide de aula sobre o tema, que você encontra aqui.
Comentários
Só para fazer uma pequena propaganda. Estou compilando links para artigos em PDF na área do direito, quando puder, dê uma olhada: http://linkslegallibrary.blogspot.com
Forte abraço
Julio
Está ficando bacana a nova versão da "Biblioteca do Escritório", hein! Meus parabéns pela iniciativa, que deve estar dando um bom trabalho...
Ah, terminei o artigo para a Panoptica. Vou lhe encaminhar depois do feriado, ok?
Abraço!
A biblioteca dá um trabalho, mas fica mais fácil de achar as coisas depois, hehehe.
Fico no aguardo, então, pelo artigo.
Forte abraço
Julio