Quem tem medo do Exame de Ordem?

Novamente nos deparamos com notícia acerca de decisão judicial que afasta a aplicabilidade do Exame de Ordem a 6 Bacharéis de Direito do Rio de Janeiro, formados pela Universidade Veiga de Almeida (conhecida como UVA).

Trata-se de sentença (veja transcrição integral aqui) proferida nos autos do Mandado de Segurança n. 2007.5001.027448-4, no qual já havia sido deferida decisão liminar no mesmo sentido, logo suspensa pelo TRF da 2a. Região em sede de Agravo de Instrumento (Decisão Monocrática e Acórdão). A sentença também foi suspensa, desta vez por decisão da presidência do mesmo TRF, em sede de Pedido de Suspensão de Segurança apresentado pela OAB/RJ.

Segundo os Impetrantes (veja a inicial aqui), o Exame de Ordem consistiria em exigência que teria sido revogada pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDB, além de ser inconstitucional. Quanto a este argumento, os Impetrantes utilizam uma fundamentação interessantíssima. Vejam:

23. Se somente a lei, em sentido estrito, pode restringir o exercício profissional e apenas por motivos de qualificação, também somente a lei, em sentido estrito, pode definir e regulamentar as condições para o exercício profissional.

24. Donde se percebe que a lei 8.906/94 delegou ao Conselho Federal algo que é privativo do legislador federal e indelegável. Impossível que o Congresso Nacional e o Presidente da República transfiram suas prerrogativas constitucionais a uma entidade que sequer faz parte da Administração Pública, a OAB. Pior ainda quando tal entidade é interessada em restringir o acesso ao mercado de trabalho por razões corporativas.

25. Ninguém será obrigado a deixar de fazer algo senão em virtude de lei: jamais em virtude de normas do Conselho Federal da OAB. Tal Ordem não pode agir em substituição ao legislador naquilo que é atribuição privativa da lei por determinação da Constituição Federal. Descabido que tal Conselho discipline o que significa exame de ordem, e posteriormente regulamente a matéria com cunho normativo. Usurpando função do Congresso Nacional e do Presidente da República para restringir, por motivos outros que não a qualificação profissional, o direito de exercer a profissão jurídica.

26. Ressalte-se que a lei 8.906/94, como já dito, não se deu ao trabalho de dizer o que é o "Exame de Ordem". Deveria tê-lo feito, sob pena de ser descabido qualquer obstáculo àquele que pretende exercer a profissão. Impossível que uma entidade de mera fiscalização da categoria substitua o legislador na definição e regulamentação de restrições ao exercício profissional de um cidadão que foi considerado habilitado pela instituição de ensino reconhecida e fiscalizada pela União.
Segundo a tese, o Estatuto da Advocacia e da OAB não teria sido claro o suficiente ao definir o "Exame de Ordem" como requisito para o exercício profissional, de forma que os atos expedidos pela OAB teriam violado os limites do mero regulamento a ponto de criar obrigação nova.

Com todo o respeito aos bacharéis impetrantes, penso o seguinte:

a) A LDB não revogou a necessidade do Exame de Ordem, já que ela trata dos requisitos para formação do Bacharel em Direito, ao passo que o EAOAB versa sobre o exercício da profissão de advogado. Na ausência de identidade entre os âmbitos de validade da norma (como ensina o saudoso Norberto Bobbio) não há que se falar em antinomia e, logo, inexiste aplicação da regra de que "lei posterior revoga lei anterior". Como sabemos, não existe "faculdade de advocacia", mas de Direito.

b) O Exame de Ordem não é inconstitucional, pois a regulamentação legal das profissões é prevista no inciso XIII do artigo 5o. da CF/88 ("XIII - é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer") e a Lei não precisa descer às minúcias quando estabelece obrigações. A aplicar o raciocínio dos Bacharéis Impetrantes em caso análogo, não existiria a obrigação de as pessoas naturais realizarem a declaração anual de Imposto de Renda, já que a Lei do IR não estabelece como será o formulário de declaração, qual o prazo para fazê-lo, etc.

E reitero o que venho sempre dizendo:

Exame de Ordem não é reserva de mercado. É proteção ao mercado.

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